terça-feira, 17 de dezembro de 2019

JOGO EMOCIONAL (I)



http://projetopassofundo.com.br/



por: Tânia Du Bois

A música é suspiro efêmero, mágica elevada aos céus e ao inferno: relembra momentos e embala meu corpo no ritmo no prazer e da dor da saudade. Como em Geraldo Vandré, no Festival da Canção de 1968, “caminhando e cantando e seguindo a canção / Somos todos iguais braços dados ou não / Nas escolas, nas ruas, campos, construções...”.

A vida é feita de opostos que se completam: tendo a lembrança, como esquecê-la? Na música encontro o reconforto pelo que passou e restou apenas na sonoridade sentida como recordação. Por isso, reinvento o viver, musicalmente, para sentir o presente. Assim, na música Alegria, Alegria, de Caetano Veloso, “Caminhando contra o vento / Sem lenço e sem documento...// Eu tomo uma Coca-Cola / Ela pensa em casamento / E uma canção me consola / Eu vou // Sem lenço e sem documento / Nada no bolso ou nas mãos / Eu quero seguir vivendo o amor...”; marco do movimento tropicalista ao ser apresentada, em 1968, no Festival da TV Record.

Quando escuto músicas, sou tomada pelo jogo emocional em cenas de luzes, cheiros e sabores, onde meu pensamento se alia ao tempo que se amplia, fosse mar de sentimentos.

Os músicos constroem “arquiteturas” exuberantes, pois, conseguem retratar meu “clima envolvente” em cada canção, refletindo a alegria e a tristeza como momentos únicos, onde interiormente grito minhas saudades.

São inúmeras as vezes em que a música me ilumina em tons, que me permitem “fingir" que estou revivendo o jogo emocional; assim, o show de Bossa Nova, em 1960, intitulado A Noite do Amor Do Sorriso e Da Flor, apresentado nas dependências da UFRJ, com a participação de João Gilberto; Ronaldo Bôscoli anunciou que “Esta é a noite do amor, do sorriso e da flor. E este é realmente o primeiro festival de bossa nova mesmo. Não se espantem...”.

Sei o valor da música na vida; nela navego nos braços dos sentimentos; vejo o por do sol se refletir nas águas do mar, deixando claro esta vida de sombras. Então, sinto a importância da música, porque ela dá a sensação de poder envolver o passado nas lembranças presentes; como acontece quando escuto Elizeth Cardoso, na comemoração dos 50 anos de Bossa Nova, em Chega de Saudade: // “Chega de saudade / Vai minha tristeza e diz a ele / Que sem ele não pode ser...”.

Momentos em que, ao resgatar detalhes do meu viver, sinto vontade de estar novamente dançando pelo tempo e ouvindo a alegria do coração, como proposta para capturar as “imagens” como jogo emocional. Evinha bem refaz, cantando // Eu vou voltar aos velhos tempos de mim / Vestir de novo meu casaco marrom / Tomar a mão da alegria...


│Crônica constante de A Linguagem da Diferença (Projeto Passo Fundo, 2019), de Tânia Du Bois.
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Leia também:
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DOIS TRECHOS DA ESCRITA DE PEDRO DU BOIS



Nascido
nato
neto de quem não conheço
rebento a bolsa
e espalho Líquido
onde me encerro.

           Estou pronto
           na imensidão do pranto.

Sou o choro
do desaparecimento.

Vindo de todas as partes
reparto minha inconsciência
ao alvor dos dias
                    amanhecidos.

(o pão dormido)

                em auras descoloridas.

    A chuva lava a terra
    a chuva leva a terra
    a chuva aterra

Desintegrado em glórias
levadas ao mínimo exigido

              ressurjo em lembranças
              - anotações
                e desenhos
trançadas sombras de diálogos
            extensivos aos contratempos.

Honro o lugar desocupado
em desculpas: esfarrapo palavras
                              balbuciadas
                                ao vento.

[...]

│Excerto da secção “O suportável hábito de me fazer ausente”, p.39-40, do livro Limites e outros exageros: e alguns poemas (Projeto Passo Fundo, 2019, de Pedro Du Bois: http://projetopassofundo.com.br/.

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Em mim contemplo quem deteriorado
em erros contém o exagero:

                amo na paisagem
                o horizonte
                limitador
                da forma.

Antevista no reflexo
sei a idealização da fera.

De onde venho trago
a indefinição do amor
ressentido em paixões.

O intransitável na forma
construída em embates: minha
consciência no esforço
de me fazer traição
                  e medo.

- inverno –

    Sou invenção teórica do inexistente.
    Habitante contumaz de salões
    em luzes abaixadas no extremo
    do reconhecimento.

                    Texto inconcluso
                    de pontos finalizados
                                em destempero.

│Excerto da secção “O animal insaciável”, p. 157 do livro “Limites e outros exageros: e alguns poemas” (Projeto Passo Fundo, 2019), de Pedro Du Bois.


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Leia também:
- CHAMAS
- Importância
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CHAMAS



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Os candelabros acesos
a janela aberta à noite: estranhos sentimentos
cruzando o espaço. Na terra úmida a estrada
se desfaz em passos. A chama trêmula
se oferece ao vento. O ar se rarefaz
consumido pelo fogo. Fechada a janela
oferece a paisagem interior.


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FLAMES

The lit candle holders
an open window at night: strange feelings
crossing spaces. On the moist earth the road
crumbles into steps. The trembling flame
offers itself to the wind. The air rarefies
consumed by the fire. Closed window
offers inner landscapes.


[Tradução de Marina Du Bois, que traduziu todos os poemas do livro para o inglês]


│Poema constante de Imagem & Reflexo (Projeto Passo Fundo, 2018), de Pedro Du Bois.


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● IMPORTÂNCIA
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segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

NEM TANTO AO MAR...


CURIOSIDADE – Encontrei texto do acadêmico e ex-presidente do Brasil José Sarney, em que ele trata do nosso maltratado idioma. É do ano de 2011, mas está valendo, já que essas discussões não têm fim mesmo. Chama-se “Fale errado, está certo”. Disponibilizo o link para quem se interessar: http://www.academia.org.br/artigos/fale-errado-esta-certo.

De minha parte, tento seguir o famoso "Nem tanto ao mar, nem tanto à terra", que, dizem, é um provérbio português.

Um outro texto, este do professor Bechara, também membro da ABL, trata do mesmo assunto. Tem por título "A sabedoria do equilíbrio": http://www.academia.org.br/noticias/sabedoria-do-equilibrio-por-mestre-bechara.

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ELIS

Elis,o filme.
Revi o filme “Elis”, do diretor Hugo Prata, em que a Elis Regina é interpretada pela Andreia Horta. Considero o filme muito bonito e comovente, até por me lembrar de coisas que o Brasil já mais tenha (ou tenha, mas não valorize). Veio-me à cabeça um disco, o último de estúdio que ela gravou. A primeira música já é iluminada; chama-se “Sai dessa”, um balanço bem alto astral:

“Sonhei que existia uma avenida
Sem entrada e sem saída pra gente comemorar
Toda hora, todo dia, toda vida
Na tristeza e na alegria, sem plateia e sem patrão”

É fácil encontra-la no Youtube, como o restante do disco, cuja direção musical é do César Camargo Mariano. E hoje, em face de tanta música ruim que há por aí, ouvir Elis é até um ato de resistência. É estar bem acompanhado.

│Ficha técnica do álbum "Elis", de 1980, no Discogs:
https://www.discogs.com/pt_BR/Elis-Regina-Elis/release/2394479.
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domingo, 15 de dezembro de 2019

TRÊS GARÇAS









É noite.
Três garças voam num céu possível.
Ao fundo, silêncio.

Dou-me conta de ter isto,
antes que não mais possa.
Dou-me conta de sair dos irrisórios.


│Autor: Webston Moura│


|Imagem: Depositphotos

IMPORTÂNCIA


Penso na importância
dada aos fatos
(agora) irrelevantes

lembrados momentos
decisivos: risíveis
                   agora

- água turva da sujeira
  entornada ao poço -

restada importância
pela mediocridade
na vida diária
das miudezas
que dão sentido.


│Autor: Pedro Du Bois - http://pedrodubois.blogspot.com/



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Outros poemas de Pedro Du Bois:



│Resenha de W.J. Solha sobre livro de Pedro Du Bois:

│Resenha de W.J. Solha sobre livro de Pedro Du Bois:

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terça-feira, 9 de abril de 2019

REENCONTRO


Novamente, busco no bolso o papel:
a rua está certa; o número, idem.
Devagar, aproximo-me da porta,
uma porta antiga, mas ainda forte.
Hesito. Respiro.
Três toques. Espera.
Quem abre, uma menina.
Meus olhos naqueles,
o mesmo lábio torto do lado direito,
a textura dos cabelos,
o andar,
um sinal outro semelhante.                          
─ Pois não!
Uma lágrima a seus pés,
minha,
a voz embargada.
(Será que ainda caibo nesta crescida vida?)


│Autor: Webston Moura│

AQUELE NAVIO



Melancholy (1894) - Edvard Munch





Teus olhos,
ondas,
o sal crestando,
vapor,
areia,
vivo calcário,
roupa leve,
um beijo.

Agora,
aquele navio
naufragado,
coberto de lodo,
guardando toda a louça que não lhe serve.




│Autor: Webston Moura│



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Webston Moura
, administrador deste blog, é Tecnólogo de Frutos Tropicais, poeta e cronista. Natural do Ceará, Brasil, mora no município de Russas, na região do Vale do Jaguaribe. Aprendiz de Teosofia, segue a Loja Independente de Teosofistas - LIT. Tem apreço por silêncio, música, artes plásticas, bichos e plantas. É também administrador dos blogs O Caderno Livre e Só Um Transeunte.
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NUM DIA DE ABRIL







Sim, sei que as águas são muitas,
reinauguram o mundo.
Na beira deste riacho,
pedras lisas por onde meus pés se vão,
vida fresca sob o mais limpo azul,
peixes prata, esverdeados e cor de estrelas.
Bem parece que o mundo é só este.
Dou na sombra de uma árvore,
afastada um pouco,
vida antiga, mãe de outras.
Escuto pássaros e assobios,
o vento é manso, mas presente.
Aqui não nascem desdoiros.

* Imagem: Google Images

│Autor: Webston Moura│


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Webston Moura
, administrador deste blog, é Tecnólogo de Frutos Tropicais, poeta e cronista. Natural do Ceará, Brasil, mora no município de Russas, na região do Vale do Jaguaribe. Aprendiz de Teosofia, segue a Loja Independente de Teosofistas - LIT. Tem apreço por silêncio, música, artes plásticas, bichos e plantas. É também administrador dos blogs O Caderno Livre e Só Um Transeunte.
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