quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

MUTIRÃO 3 NO ISSU

Terceira edição do Livreto-revista Mutirão. Com participação de André Dias — Bárbara Costa Ribeiro — Brennand de Sousa — Carlos Nóbrega — Carlos Vazconcelos — Cláudio Araripe — Deribaldo Santos — Ellis Mário Pereira — Francisco de Almeida — Henrique Beltrão — Jarbas Oliveira — Liciany Rodrigues — Lia Leite — Luis Marcos — O Poeta de Meia-Tigela — Ralphe Alves — Raymundo Netto — Rosanni Guerra — Suellen Lima — Webston Moura

Para acessar e ler a publicação Mutirão 3, organizada por Alves de Aquino, O Poeta de Meia-Tigela, clique neste link: https://issuu.com/opoetademeia-tigela/docs/mutirão3.

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

BORBOLETA



Butterflies - Odilon Redon





O que me desorganiza, é esta borboleta.
Não é outra, semelhante, mas esta,
uma borboleta estranha e, como todas, paciente,
capaz de estacionar, imóvel, de parar o espaço que ocupa,
de hipnotizar o ar em redor e ocultar a duração do tempo.

Não há néctar nas cortinas,
nem nos móveis,
tampouco nos livros.
Assim, por que ela não some?

O azul de suas asas, forte e denso, é pétreo.
Nunca o vi, sequer o imaginei.

Noutro tempo, havia candeeiros, muitos,
como num enxame, luzes infinititas.
Peixes deslizavam no ar, luziam cores ácidas.
Loreena McKennitt cantava “Stolen Child”.
E não havia esta borboleta
─ que incide e subleva, sem dar clareza dos porquês.


│Autor: Webston Moura│

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

MAIS


Não nos damos exatamente
pelo mistério das coisas,
que é apurar os olhos sobre o invisível.

Oculta, a vida é mais.

Sequer nos vemos senão como
essas unidades de produzir e sofrer,
de repetir os olhos e repisar a paisagem.

Mas, oculta, a vida é mais.


│Autor: Webston Moura│


LUGARES DE SER


Eu quero ser como a Rita Lee,
um lírio forte, uma pedra meiga,
uma cadeira na calçada do anteontem.

Eu quero o aroma da manga
desfazendo aflições e angústias.

Eu vi um Zepelim indelével
compondo a formosura do azul.

Eu quero a cachoeira secreta de águas lídimas,
onde nenhum ruído desagradável tome posse.

Eu quero palavras-vazios,
lugares-de-ser.

E quero poder jardins em meu coração.


│Autor: Webston Moura│


GRAÇA


É assim mesmo, gratuitamente.
Andar sem rumo, devagar, cidade ir, ruas e ruas.
É assim, sem um grande plano, sem uma terra a conquistar.
Se chover, não se corre, que a chuva desliga o tempo.

Ah, o tempo, o cão e o portão, o crachá, a burocracia!
Não! Não é deste tempo rijo que precisamos.
É daquele outro, daquele dito fruição.

Fruição:
1.Usufruir de goiabas no pé e do verde nos olhos de quem der;
2.Ouvir, sem afobamento, “Dr. Joe”, com Chick Corea,
John Patitucci e Antonio Sanchez;
3. Sonhar com Maria Casadevall.

É assim, e não pense, que pensar dá pregos.
Andar sem rumo, devagar, cidade ir, ruas e ruas.
Se chover, seja tão despossuído quanto um mendigo

ou um poeta.


│Autor: Webston Moura│

ASA PERDIDA


A ave, livre, voa e vê o que não vemos,
sente o que não sentimos, vive sua singularidade.

Armadilhamos sua vida em gaiolas bem cuidadas,
damos-lhe de comer e de beber e lhe exigimos um canto.

Presa, ela canta o que nossa prisão íntima supõe ser alegria.
Ela canta ─ bem nos disse um bruxo ─ a saudade-dó.

E o que fazemos com o canto-cárcere
que não poderíamos fazer com o voo-dádiva?
Sabe-se lá! Ou, de outro modo, sabe-se, sim:
                             fazemos mando presunçoso,
pois desaprendemos nossas próprias asas.
E nosso canto é farto dó e demasia de exílio.


│Autor: Webston Moura│

ÍMPAR


Você, nua, parece um águia,
parece um leão farto sobre nuvens,
parece uma inscrição encontrada nos Pireneus,
parece aquele carnaval de 1976,
parece o olhar de um gnu,
parece a Ursula Andres num siso ordenador.

Você, nua, paralisa o silêncio em seu zênite
e agrupa meu sangue na densidade mais elétrica.

Você é um solo do Jimmy Page contra as horas-não.


│Autor: Webston Moura│

terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

CONFISSÃO SOBRE A PALAVRA AUSENTE


O que não escrevo,
as cargas de fósforo que o mofo come,
a luz que não nasce e, ao contrário,
desaparece nos confins do não-sei-quê.

O que não escrevo,
o sangue-incógnita perdido na coisa-vã,
a gueixa e a batalha gaveta adentro,
o aroma sem qualquer asa.

Sim, eu sei que esse é um tempo de testemunho.
Mas me cansa essa gente toda se afogando no incalculável.


│Autor: Webston Moura│