terça-feira, 27 de outubro de 2020

DESCONSOLO



Senhor,
sei que bem não nos vemos,
apesar do trajeto comum,
esta rua nossa descalça de pavimento,
este nosso conviver cego, silencioso,
diria mesmo alienado
– eu do senhor e o senhor de mim
e nós, suponho a vós também, do mais
que poderíamos ser nesta vida.

A dureza nos toma, sabemos,
a sina de pagar por tudo
a outros senhores que nos querem
apenas braços, votos, disciplina
e docilidade escrava, coisas amansadas
que somos, vozes amiudadas.

Senhor,
Rogo-vos nada mais
que a escuta a este lamento!
E se tiverdes um, também o escutarei.
Quem sabe, canção se faça entre nós,
ao menos para não nos doermos sós,
tão sós, ensimesmados de medo.

Repara no cão,
abandonado bicho!
Cata aqui e ali.
Algures consegue água,
um pouco de comida
e até a atenção dalguma alma caridosa.
Aquele cão repleto de ausências,
quem é senão nós?


 │Autor: Webston Moura│

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