quarta-feira, 1 de março de 2017

GOIABEIRA

É uma goiabeira pequena, lá no fundo do quintal.
Solitária de outras fruteiras, só de quase tudo.
Construiu sua vida, independente das vicissitudes.
Deu frutos comuns, sombra pouca, só o que lhe coube.
Está findando-se, nobre e simples.

Psidium guajava, seu nome oficial, como o de seu fruto.
Mas, para os passarinhos, o ótimo e rápido pouso,
um ruge-ruge suave, um entra-e-sai sob a luz mutante das horas.

Sua voz é (convém-me ser, em minha limitação) o que meus olhos
e os meus outros sentidos podem captar de seu silêncio arbóreo.
E bem conversamos nesses anos todos, de inverno a inverno.
Nem nos apercebemos da idade passando.

E cá estamos: outra noite em que a vejo dormir sob a lua,
uma criança que não pude ter nos braços, mas muito direto na alma.


│Poema da Série “Árvores” – Autor: Webston Moura│

FLAMBOYANT

As casas com sobra de terreno à frente,
a fazer as vezes de jardim, embora não,
tinham nichos de natureza.
Alegre e forte, algum pé de flamboiã,
com o vermelho ao alto, fulgindo.

Veio de Madagascar nalgum remoto dia,
de modo direto ou por viés de desviado contrabando.
Árvore acentuada de paz, especialmente assim.
Ou, se me cabe, digo deste modo como sinto,
árvore da infância, dentre outras tantas,
perpétua ternura da genuína meninice.

Nunca lhe direi “Delonix regia”, nome sisudo que é.
Encontrando-a por aí, numa rua ou noutro lugar,
apenas lhe serei amigo, sem precisar dizer palavra.
E nos entenderemos nesta linguagem particular.


│Poema da Série “Árvores” – Autor: Webston Moura│

O MAMOEIRO

Todas as casas tinham mamoeiros, assim procede dizer.
E hoje não mais os vejo; não há mais quintais.
Frágil, um tronco que se abate fácil a golpes quaisquer.
De seus galhos, uma flauta que um dia vi meu avô engenhar.
Suas folhas caindo, de quando em quando, secando-se tal papel.
E sua virilidade resistente ao vento.

Não se pode, por frutos dispostos em supermercados,
saber da árvore em si, que esta relação liga-se ao todo.
Há que se colocar em marcha para algum refúgio,
onde uma senhora de ervas e fogão a lenha,
mãe a avó de uns tantos, tenha se dado a plantá-la.
Avistar-se-á, é bem certo, algum pássaro colhendo o mel,
a polpa que se pode ao fruto de entranhas amarelas
e sementes negras, elegantes capsulas.


│Poema da Série “Árvores” – Autor: Webston Moura│