quarta-feira, 2 de novembro de 2016

SÓIS QUE JÁ SE FORAM

Meus ossos,
as memórias que carregam,
os sóis que já se foram,
mais ainda, as tardes.

Amarre direito, com calma!
Ia-me, em seguida, arrastando
o carrinho verde pelo chão.

A vaca pastava;
o bezerro, quieto;
azul, o horizonte;
tudo era completo.

Ainda poucos,
meus irmãos
─ dou-me conta ─
onde estão?
Nalgum vão da casa,
num quarto cuja cor me foge.

Num dia de Natal,
vestiram-me uma calça marrom
de um tecido novo.
O botão, osso lapidado,
encerrava-me na segurança de quem,
                                                brincando,
                                 imitava um adulto.

Acho que vou chorar.
Para onde estão me levando?

Vozes,
gente que nunca vi,
horas da noite em que nunca abri olhos,
e, lá fora, a cidade, o encanto enorme.

Depois, dormi.
Com o que sonhei,
se em todo, naquele dia, sonhei?

Sóis que já se foram.

│Autor: Webston Moura
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domingo, 25 de setembro de 2016

TUDO É SECRETO

Comove-me a vida, não seu desandar.
A luz, caso se apague, põe-me diligente
a soprar-lhe a força, aquela mais íntima
que os homens cismam, mas não veem.
E, caso quieto e à espera que volte, rezo:
olhos fechados, cheiro de tudo ao nariz,
rogo a antigos e ígneos deuses uma lâmpada.

Comove-me a vida, não sua balbúrdia.
Ando, passos lentos, e leio a placa:
“Coronel Araújo Lima” ─ quem terá sido?
Perto, um vendedor de tapiocas passa
e anuncia seu ganha-pão. Terá filhos? Quantos?

Tudo é secreto.

Comove-me a vida, seus acidentes sentimentais
e toda a possibilidade de abrir portas e janelas.
A pressa com que os transeuntes seguem, não.
Tampouco a fumaça irresponsável de seus carros
e os humores maldizentes com que se corroem.

Uma moça atravessa a rua.
Nas mãos, O tronco do ipê.
De soslaio, olha-me;
depois, olhos ao chão, sorri.
Segreda-me, em plena rua, valsas:
a pequena tatuagem, em voo livre, num dos pés.

Comove-me a vida.
E isso inclui o cão feridento e sujo
que, à porta do mercado,
fala-me olhos de socorro e perdão.
Faz-me pensar na carga de humanidade que trago.


│Autor: Webston Moura
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quarta-feira, 21 de setembro de 2016

CONVERSAS

Não a conversa dos vizinhos
pelas janelas
abertas
nos assuntos
de todos os dias

a conversa ampliada
em gestos e sorrisos
na mímica
  e música

não a descoberta da vontade
em palavras imaginadas
nos mistérios
e desvendadas
em conversas
de vizinhos
no que acontece
diariamente.


│Autor: Pedro Du Bois
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POEMA retirado do blog do autor: http://pedrodubois.blogspot.com.br/

Pedro Du Bois, poeta e contista. Passo Fundo, RS, 1947. Residente em Balneário Camboriú, SC. Vencedor do 4º Prêmio Literário Livraria Asabeça, Poesia, com o livro Os Objetos e as Coisas, editado pela Scortecci Editora, SP. Tem publicado pela Corpos Editora, Portugal, A Criação Estética; Pela Sarau das Letras, Mossoró, RN, Seres; Pelo Projeto Passo Fundo, Brevidades, Via Rápida, Iguais e Em Contos; Pela Editora Penalux, O Senhor das Estátuas. Blog [http://pedrodubois.blogspot.com.br/].