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sábado, 27 de abril de 2024

Noite de Abril






Hoje, noite de Abril, sem lua,
A minha rua
É outra rua.

Talvez por ser mais que nenhuma escura
E bailar o vento leste
A noite de hoje veste
As coisas conhecidas de aventura.

Uma rua nova destruiu a rua do costume.
Como se sempre nela houvesse este perfume
De vento leste e Primavera,
A sombra dos muros espera
Alguém que ela conhece.

E às vezes, o silêncio estremece
Como se fosse a hora de passar alguém
Que só hoje não vem.


|SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, in POESIA (Ed. Autora, Coimbra, 1944; Assírio & Alvim, 2014)
|Imagem: Colagem © Donna Watson

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, administrador deste blog, é Tecnólogo de Frutos Tropicais, poeta e cronista. Natural do Ceará, Brasil, mora no município de Russas, na região do Vale do Jaguaribe. Aprendiz de Teosofia, segue a Loja Independente de Teosofistas - LIT. Tem apreço por silêncio, música, artes plásticas, bichos e plantas. É também administrador dos blogs O Caderno Livre e Só Um Transeunte.
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terça-feira, 23 de abril de 2024

Dualismo







Não és bom, nem és mau: és triste e humano...
Vives ansiando, em maldições e preces,
Corno se, a arder, no coração tivesses
O tumulto e o clamor de um largo oceano.
Pobre, no bem como no mal, padeces;
E, rolando num vórtice vesano,
Oscilas entre a crença e o desengano,
Entre esperanças e desinteresses.
Capaz de horrores e de acções sublimes,
Não ficas das virtudes satisfeito,
Nem te arrependes, infeliz, dos crimes:
E, no perpétuo ideal que te devora,
Residem juntamente no teu peito
Um demónio que ruge e um deus que chora.


|De Olavo Bilac
|Aquarela: "Faces", de Arline Wagner


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quarta-feira, 6 de março de 2024

A Palavra Mágica







Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
a senha do mundo.
Vou procurá-la.
.
Vou procurá-la a vida inteira
no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
não desanimo,
procuro sempre.
.
Procuro sempre, e minha procura
ficará sendo
minha palavra.

*

Autoria: Carlos Drummond de Andrade, em Discurso da Primavera e Algumas Sombras (1977)

Ilustração: Um pote cheio de palavras, ©Sonja Wimmer



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SINTO SINTO







Falar, non falo galego
pero sinto.
As cousas da miña vida
son agarimosas,
As amo con todo ardor;
Son elas mesmasáquí, abaixo, alá,
tódalas mesmas, sinto
como almas.

Sinto o paxaro que vai voar
polo sendeiro, sinto as borboretas
cantando neses ramalletes,
sinto as margaridas que se pousan
neses prados, como se foran meus
Sinto, sinto....

*

Autoria: LUISA PAZ MONTENEGRO, in POETAS DO REENCONTRO II (2021)

Óleo sobre tela: Calypso, de George Hitchecock

*



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domingo, 26 de novembro de 2023

RETRATO






A pele era o que de mais solitário havia no seu corpo.
Há quem, tendo-a metida
num cofre até às mais fundas raízes,
simule não ter pele, quando
de facto ela não está
senão um pouco atrasada em relação ao coração.
Com ele, porém, não era assim.
A pele ia imitando o céu como podia.
Pequena, solitária, era uma pele metida
consigo mesma e que servia
de poço, onde além de água ele procurara protecção.

*
Fotografia (c) Andrea Kiss

|LUÍS MIGUEL NAVA, in Colóquio/Letras n.º 104/105, Julho de 1988, Fundação Calouste Gulbenkian




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UM DIA






Um dia, gastos, voltaremos
A viver livres como os animais
E mesmo tão cansados floriremos
Irmãos vivos do mar e dos pinhais.

O vento levará os mil cansaços
Dos gestos agitados irreais
E há de voltar aos nossos membros lassos
A leve rapidez dos animais.

Só então poderemos caminhar
Através do mistério que se embala
No verde dos pinhais na voz do mar
E em nós germinará a sua fala.

*

Arte © Denis Sarazhin

SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN, in DIA DO MAR (1947; Assírio & Alvim, 2014)




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POEMA DE MÁRIO CESARINY







Reconheço este quarto impermeável
reconheço-te estás adormecido
o peito muito aberto as mãos luminosas
o grande talento dos teus dentes miúdos

Há o perigo de um grito lindíssimo
quando andas assim comigo no invisível

Quando a manhã vier sairás comigo
para o espaço que nos falta para o amor
que nos falta

A aurora
está fatigada

a aurora
como um rio nosso
em torno dos elevadores

Tinha eu a idade
de um marselhês
silencioso
e tímido

Tu davas-me a lousa dos magos
o teu riso as letras
mais obscuras do alfabeto

Foi há muito tempo
ou agora
na caverna dos leões expressivos

A caverna que dá para a caverna
a caverna os lagos diligentes

Belo tu és belo
como um grande espaço cirúrgico

Porque tu não tens nome existes

A minha boca
sabe à tua boca

A minha boca
perdeu a memória
não pode falar as palavras
entram no seu túnel
e não é preciso segui-las

Disse que és alto
alto
branco e despovoado

*
Imagem: Cortesia Bertrand Livreiros*

MÁRIO CESARINY, in PENA CAPITAL (1957; Assírio & Alvim, 2021)



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