Clauder Arcanjo
— Você não devia ter largado tudo. Tal busca, como
qualquer busca humana, era aquilo que o mantinha vivo, útil. Sem ela, você
ficará no vazio, ou, no máximo, no húmus do nada. Nada este, acredite, colhido
na cova da terra dura, numa noite fria e longa. Onde o medo e a dor serão eles
os únicos, e desleais, companheiros. Repare agora na sofreguidão dos seus
passos, na tibieza de sua voz, nessa face lívida e carregada de dobras de
receios. Não, não conseguirá subir ao cume de...
— Eu nunca quis, nem quero, chegar ao topo! A
planície sempre me bastou. Nela, o que há de concreto e permanente me basta;
bem como o seu cabedal de dúvidas é o bastante para pesar-me nas costas. Somos
humanos, e a junção desses dois bocados não pode transbordar do pote da nossa
carne, há um limite no volume do espírito que os contém e retém...
— Você, Acácio, vai acabar afundado no pântano das
filosofices que você mesmo fustiga! Há fantasmas demais no real, para ainda
espicaçarmos o desconhecido, o ininteligível. Munido com suas teorias
racionais, como se essas bastassem para abrir e entender o que jaz em esfera
outra; você, feito um louco, claudica e se espanta, sem compreender, sem
decifrar. E, desta forma, o horror ainda mais o entontece e, vira e volta, o
faz cair, sedento e faminto, na terra oca das ilações, das suposições.
Suposições que, ao tentar parti-las em pedaços menores, a fim de estudá-las,
elas se reproduzem infindamente, sem mencionar que se travestem de outras
formas, como se paridas por outros tipos.
— E o que nós somos, se não um investigador do
indecifrável, do inenarrável?... As palavras são a semente do inaudito, e o
inaudito provoca o verbo jamais dito. Como se decifrar e traduzir fossem o moto
contínuo de viver.
— Pare e se volte para o sol. O dia nasce, apesar
de seu desespero, Acácio. Os pássaros louvam o dia, enquanto você o recebe no
altar das suas aflições...