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terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Nos 75 anos da libertação de Auschwitz



Auschwitz


"Não sei se há no mundo alguma palavra com a mesma ressonância, mas Auschwitz representa, de alguma forma, a quinta essência do terror no Século XX. Sei que os judeus não gostam que se fale de Auschwitz, nem sequer aceitam sem polémica as diferentes versões ou reflexões que esta monstruosidade gerou em criadores ou pensadores judeus, mas não participo nesta espécie de sentimento religioso que impede que se pronuncie um nome, seja o de Deus, seja o do horror. Não: todas as palavras, incluindo as mais dilacerantes, podem e devem ser ditas e pensadas. Auschwitz pertence à humanidade doente, os que ali morreram eram nossos semelhantes, é igual que fossem judeus, ciganos, homossexuais ou comunistas, todos foram assassinados porque houve quem se tenha sentido superior e não tenha querido aceitar o diferente. Esta é a maior atrocidade, que haja quem esteja disposto a assassinar, a eliminar, para impor o seu cânone, a sua lei, a sua norma. E repara que a tragédia não acabou com o final da II Guerra e a manifestação, em toda a sua crueldade, da magnitude do horror: Hoje mesmo, em África, que está tão próxima de minha casa, na América também, estão a produzir-se episódios de eliminação sistemática do outro. É-me igual que seja em câmaras de gás ou pela fome ou epidemias, cuja origem não se conhece e cujo remédio está ao alcance de qualquer laboratório farmacêutico. Auschwitz não está fechado, continua aberto e as suas chaminés continuam a soltar o fumo do crime que todos os dias se perpetra contra a humanidade mais débil. E posso assegurar-te que não quero ser cúmplice, com o meu cómodo silêncio, de nenhuma fogueira."

José Saramago, in "Conversaciones con Saramago", de Jorge Halperín

Fonte: Fanpage da Fundação José Saramago:
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